Como o amor foi parar nas redes sociais

Thaylan Sk | 12:54 | 0 comentários


“Quem inventou o amor? Explica, por favor.” Poderia ser uma boa ideia, assim como fez a Legião Urbana nesses versos, recorrer ao criador do sentimento para que ele tentasse nos explicar por que o amor anda tão exposto nas redes sociais. Você já deve ter se deparado com declarações, troca de carinhos e presentinhos virtuais entre os amantes e discussão de relação nos comentários de uma postagem na sua timeline do Facebook ou em outros sites de redes sociais. Mas alguém já parou para se perguntar o que leva os casais à exposição de sua intimidade para o público? E o público, como reage ao acompanhar a rotina e até as situações mais delicadas do casal expostas na rede?
No início dos anos 2000, o que se conhecia sobre sites de relacionamentos eram aqueles com o propósito de unir duas pessoas, em que um usuário preenchia um cadastro com seus dados pessoais, preferências, informações sobre seu tipo físico e o do par que gostaria de encontrar. Com muita sorte e um pouco de persistência, você poderia achar seu príncipe encantado ou sua mulher maravilha. Tudo feito ali entre dois perfis com objetivos comuns, buscando um romance. Algumas informações e fotos privadas depois, mais algumas conversas, encontros pessoais e, então, surgiam novos pretendentes a namorados. Eu não sabia quem conheceu quem, o que eles contavam um para o outro, que fotos trocavam, tampouco você fazia ideia de como os pombinhos começaram a namorar.
Em tempos de Facebook, a coisa é bem diferente. Os movimentos no site, desde a atualização de status de relacionamento até uma postagem carinhosa na página do pretendente, ficam evidentes para os participantes da rede social. As trocas de status de relacionamento tornaram-se momentos tão marcantes que, pouco tempo atrás, uma página foi criada no Facebook somente para divulgar e brincar com status curiosos e engraçados. A página, chamada ‘Status de Relacionamento‘, cria alguns diferentes como “Passou de solteiro para atraído pelo edredom” ou “Passou de solteiro para em busca da costela perdida” que podem ser compartilhados e publicados em nossos murais como se aquela fosse uma real troca de status, um dos eventos cotidianos da rede. A página já foi curtida por mais de 430 mil pessoas.
Página Status de Relacionamento no Facebook (Foto: Reprodução)Página Status de Relacionamento no Facebook (Foto: Reprodução)
No dia dos Namorados, Aline recebeu, na empresa em que trabalha, um buquê de flores com um lindo cartão. Adorou as flores, se emocionou com o cartão e os deixou sobre a mesa. Horas depois recebeu uma mensagem pelo celular. Era seu namorado perguntando por que ela ainda não havia postado uma foto do buquê no Facebook. Aline, desorientada tentando encontrar uma resposta, se fez de desentendida. Piorou a situação, pois o namorado enviou uma mensagem ainda maior, indignado. Considerou um absurdo e estava muito triste por ela não publicar a foto das flores no Facebook. Continuou dizendo que, para ele, aquilo seria o reconhecimento do amor dele por ela, já que poucas mulheres receberam flores no trabalho nesse dia e que as que receberam, pelo menos as que ele conhece, postaram no site. Para o namorado de Aline, ela não deu a devida atenção ao presente. E o agradecimento dela deveria ser em público para que todos pudessem ver o quanto ele a ama. A história é real, apenas troquei o nome da personagem que recebeu as flores.
Paulo viajou para a Europa e na bagagem trouxe de presente para Bruna um livro de fotografias comprado na Suíça. Três semanas depois de receber o presente, Bruna postou uma foto do livro com um comentário no Instagram, a rede social de fotos com filtros. A legenda da foto dizia algo como “adorei o presente”. Mas parece que ficou faltando dizer mais alguma coisa. Depois de alguns comentários de amigos que curtiram o presente de Bruna, Paulo reclama o seguinte embaixo da foto: “demorou pra postar, hein! Já te dei o livro faz semanas e só agora que você teve coragem de mostrar que ganhou? Poxa!!!”. Foi o suficiente para estender uma DR – discussão de relação – de leve nos comentários seguintes, ali, na frente de todos os demais amigos seguidores de Bruna. O amor de Paulo merecia o reconhecimento do público. Mais uma história real.
Amanda sentia a falta do namorado que viajou para a África e que ainda não tinha se comunicado desde que saiu do Brasil. Decidiu, então, publicar no Facebook uma foto do casal comentando ironicamente algo como “ai, me deixaram aqui sozinha, estou sem notícias, abandonada, nem um sms, nem uma mensagem no whatsapp”. Claro, em seguida, surgiram dezenas de comentários dos amigos perguntando por que se sentia sozinha, outros mandando abraços e beijos e mais alguns falando qualquer coisa. Pouco depois da foto publicada, Amanda recebe uma ligação do seu namorado, ele explica que enviou mensagens, pergunta se ela as recebeu. Não, Amanda não recebeu, mas os dois se entendem e fica tudo bem pelo telefone. Até que o namorado de Amanda vê a foto publicada no Facebook e escreve um comentário: “bom saber que você fica espalhando por aí que eu não ligo para você mesmo eu tendo enviado uma mensagem!” Pronto, mais uma discussão de relação em público e uma história real.
Certamente que assim como essas há tantas outras histórias de amor publicadas nas redes sociais todos os dias. Já vi declarações apaixonadas por aniversários de casamento e namoro, muitas fotos com legendas românticas, promessas de amor eterno, recados e suspiros apaixonados, enfim, tem muito amor nas redes. Os infográficos que surgem todos os dias estão aí para provar como as pessoas movimentam suas vidas amorosas nesses sites. E que também não somos apenas nós, usuários, que estamos interessados nesses dados e informações. No final de junho, circulava pela Internet um infográfico de tendências identificadas apenas com base em mudanças nos perfis dos usuários do Facebook em relação aos seus relacionamentos amorosos. Pelos dados, era possível identificar, por exemplo, que sextas e sábados são dias mais propensos para terminar namoros; que quando isso ocorre, muita gente corre para o som para ouvir “The cave”, do Mumford and Sons; e que muitos usuários vão para o Facebook anunciar publicamente as mudanças no relacionamento antes mesmo de avisar para a família ou amigos. Uma coisa é certa: Zuckerberg vai saber aproveitar muito bem esses dados para ficar mais rico.
Infográfico (Foto: Reprodução)Infográfico (Foto: Reprodução)
Mas o que motiva os casais a levar para o público detalhes da sua intimidade? Por que o conteúdo dessas relações pode interessar aos amigos? E se os amigos curtem, participam, comentam, significa que estão interessados em saber mais sobre a relação do casal? Impossível encontrar uma única resposta ou sentido que explique tudo isso. Na verdade, estamos diante de mudanças de comportamento trazidas, em parte, pela tecnologia. Afinal, ainda não sabemos nem mesmo ao certo como lidar com os amigos no Facebook. Todo mundo é amigo? Tenho mesmo mais de 500 amigos? Devo separar listas por afinidades? Crio um grupo para cada colégio em que estudei? Controlo níveis de privacidade em cada publicação? E com a relação amorosa, tem regras, tem limites? Se existem tantas dúvidas, é possível que também haja muitas respostas diferentes.
É comum, na Internet, para qualquer novo tipo de ação ou comportamento buscarmos referências na vida offline, aquela que acontece fora das redes sociais. E repetirmos ou, em alguns casos, adaptarmos o comportamento na vida online. Problema pode ocorrer quando essas referências não existem, quando a tarefa é aprender a lidar com aquilo que é exclusivamente decorrente da Internet, como o grande número de amigos nas redes sociais. É nesse momento que cada um faz do seu jeito e responde a esses estímulos de formas diferentes, algumas mais estranhas, outras mais aceitáveis. Mas o que não vale é dizer que uma está certa e que a outra está errada. Assim é com as relações amorosas nas redes sociais. Já tem gente que acha exposição demais, desnecessária e que prefere se preservar. Outros acreditam ser válido compartilhar com os amigos as situações mais importantes e bonitas de um relacionamento. E tem ainda aqueles para quem as declarações de amor públicas podem servir como um meio de validar a relação.
Parece estranho falar desse jeito, afinal, por que o relacionamento entre duas pessoas precisa ser validado pelas demais? A validação, nesse sentido, está ligada à aceitação. Pode não ser regra geral, mas muito do que você publica nas redes sociais, quando é curtido,comentado, compartilhado, não é mais legal? É um sinal de que foi aprovado, de que o público gostou de saber ou ver aquilo. Por outro lado, vivemos cercados de mensagens que nos indicam como deve ser uma vida ideal, aquela em que você compra o que quer, vai onde quer, está sempre lindo e…. bem acompanhado. É isso, estar bem acompanhado, ter um namoro, um relacionamento e provar para o público que você está em linha com o que é o “ideal” também pode estar entre os desejos desses usuários.
Isso não é uma teoria, nada está determinado nesse comportamento, são apenas observações. Você já havia parado para pensar sobre isso? Como protagonista de histórias como essas ou como observador, estamos todos participando desse momento de adaptações e transformações. Tire suas próprias conclusões e compartilhe conosco.
 via Tech Tudo
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